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A força hercúlea que Evertton Araújo fez com o corpo para conseguir escapar do “golpe de judô” de Cuello (três anos mais velho que ele), e assim cabecear a bola do gol de empate do

Flamengo

contra o Athletico-PR, é como uma metáfora da vida do garoto de 21 anos. Para entrar nos holofotes no último domingo, antes o volante precisou ser forte para não desistir depois de ser dispensado de dois clubes grandes e também para resistir às dificuldades da falta de dinheiro. Ou driblá-las, como por exemplo fazendo bico de barbeiro.

Corta para 2003. A história de Evertton Araújo começou no bairro de Santa Cruz. Só que não o famoso da Zona Oeste do Rio de Janeiro. Digamos que o “primo pobre” do interior, na cidade de Volta Redonda. Filho caçula do Seu Paulo e da Dona Danielle, o garoto de família humilde cresceu como a maioria dos jovens que compartilham a mesma realidade: com a bola como o principal brinquedo.


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Evertton Araújo (3º da direita para a esquerda) começou na escolinha do Roberto Dinamite — Foto: Divulgação

Ele começou a jogar com 4 anos nas quadras da vizinhança e aos 6, quando já tinha idade, foi matriculado pelos pais em um núcleo da escolinha do Roberto Dinamite, que também ficava no bairro. E Evertton era centroavante nessa época. Agora está explicado o movimento perfeito da cabeçada de domingo. É como andar de bicicleta, não se esquece.

Por falar em bicicleta, o veículo teve papel importante no início da sua carreira. Ele estava no sub-13 quando fez um teste para o Volta Redonda, time da cidade, e passou. Muitas vezes seus pais não tinham condições financeiras para pagar as passagens de ônibus e, quando não conseguiam emprestado, o garoto pedalava mais ou menos 25 minutos para ir treinar. Certamente já chegava com as pernas pesadas.

Evertton Araújo em ação pela base do Volta Redonda — Foto: Divulgação

Além disso, a realidade no clube também não era farta como nos grandes times. Se por um lado ele tinha boa estrutura de campo e vestiário, por outro precisava bancar o próprio material, como chuteira e caneleira. Mas seus pais faziam de tudo para apoiar esse sonho. A mãe de Evertton já chegou a deixar de fazer refeições para ter alimento para ele e sua irmã mais velha, Evillyn.

Sonho esse que por duas vezes pareceu palpável. Quando estava no sub-15, e já tinha deixado de ser centroavante para virar meia, um olheiro do Cruzeiro o levou para Belo Horizonte. Só que depois de quase um ano na Toca da Raposa, acabou dispensado. A desilusão lhe sorriu para então o iludir novamente. Ao voltar ao Rio de Janeiro, conseguiu um teste no Botafogo e ficou no sub-17. Mas não por muito tempo: novamente quase um ano depois, outra vez foi mandado embora.

Evertton Araújo em ação pela base do Botafogo — Foto: Divulgação

Ele voltou para o Volta Redonda, mas o desânimo bateu. E nesse período vaidoso da adolescência, querendo ter dinheiro para ajudar em casa e também poder comprar roupas e tênis, cogitou um plano B para sua vida: fez um curso de barbeiro e passou a cortar cabelo, mesmo sem ter uma barbearia para trabalhar. Os atendimentos eram a domicílio ou no próprio CT do Voltaço. Cobrava de R$ 10 a R$ 15 o corte.

Mas uma ponta de esperança não o deixou abandonar o futebol de vez. No sub-17 do Volta Redonda ele mudou de posição de novo, passou a ser segundo volante, e subiu para o sub-20 como primeiro homem do meio de campo. Foi essa função que afastou os pesadelos anteriores e o permitiu voltou a sonhar. Em 2022, Evertton se destacou pelo Voltaço na Copinha e chamou a atenção do

Flamengo

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Evertton Araújo, do Flamengo, fez bico de barbeiro na adolescência — Foto: Divulgação

O Rubro-Negro o ofereceu um contrato de empréstimo de apenas quatro meses, mas foi o suficiente para mostrar o seu cartão de visitas. Após boas atuações, virou titular no sub-20 e teve 30% de seus direitos econômicos comprados por R$ 300 mil. No ano passado, o

Flamengo

foi campeão brasileiro na categoria e em dezembro exerceu a opção de compra de mais 40% do jogador por R$ 800 mil, renovando o vínculo até o fim de 2026. Os outros 30% pertencem ao jogador e seu staff.

Ao todo, o volante que foi o herói improvável do

Flamengo

no último jogo custou R$ 1,1 milhão e marcou o seu primeiro gol como profissional em sua sexta partida no time principal rubro-negro. E o primeiro, além de nunca esquecer, teve uma dedicatória especial:

Evertton Araújo comemora o seu primeiro gol como profissional — Foto: Gilvan de Souza / Flamengo

– Cara, passam milhões de coisas na cabeça, né? Já lembro da época do Volta Redonda, quando eu comecei. Onde minha família sempre me apoiou, sempre me orientou. Mas nós já passamos muita dificuldade, muita dificuldade dentro de casa. E passa um milhão de coisas na cabeça. Pô, gratidão, gratidão por tudo. Por isso que dediquei esse gol para minha família, por tudo que a gente já passou, tudo que eles já fizeram por mim. Estou muito feliz, cara – contou Evertton na saída da Ligga Arena no último domingo, dizendo que ligou para a Dona Danielle ainda no vestiário:


Eu liguei para minha mãe, ela chorando. Não consegui segurar também e comecei a chorar. Minha família toda mandando mensagem. Para mim, isso não tem preço”.

— Evertton Araújo, sobre reação no vestiário após seu primeiro gol.

Evertton Araújo ao lado da irmã e dos pais após o 1º título no profissional — Foto: Divulgação

Efetivado em definitivo no profissional em 2024, Evertton Araújo já vinha sendo relacionado por Tite, tem Gerson como seu padrinho no elenco e foi aplaudido por todos os jogadores e funcionários ao entrar no vestiário após oempate em 1 a 1 com o Athletico-PR. Depois dos cabelos, ele corta a fila em um plantel recheado de medalhões para tentar aproveitar mais vezes a brecha dos muitos desfalques.


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Fonte: netfla.com.br